Especialistas lançam "Manual de Biologia do Solo" para padronizar metodologia de coleta de amostragens
Da Redação FEBRAPDP
A comunidade acadêmica e profissionais das ciências naturais, biológicas, agrárias e ambientais ganham na próxima quinta-feira, 4 de dezembro, uma ferramenta essencial para compreender a complexa vida no solo. Será lançado o livro "Manual de Biologia do Solo", uma publicação que se propõe a servir como referência na área, “com dicas e instruções objetivando padronizar a metodologia de coleta e as informações fornecidas nos trabalhos, padrões utilizados internacionalmente, facilitando assim futuras sínteses e modelagens destes dados”, como explica o professor Wilian Carlo Demetrio, engenheiro agrônomo, Dr. em Ciência do Solo, Pós-doutorando na ESALQ – USP, organizador do livro.
O lançamento acontecerá no dia 4 de dezembro, às 19h e será realizada uma live nos canais de YouTube da Sociedade Brasileira de Ciência do Solo – SBCS (link aqui) e da Federação Brasileira do Sistema Plantio Direto – FEBRAPDP (link aqui), fazendo parte das comemorações do Dia Mundial do Solo, celebrado anualmente no dia 5 de dezembro. Na live de lançamento os autores falarão sobre o manual, que será disponibilizado nas versões em português e em inglês, e será informado onde poderão ser acessadas de forma gratuita.
A obra é uma compilação de conhecimentos especializados e aborda de forma detalhada os organismos macro e mesofauna que vivem no solo, como insetos, minhocas, ácaros, e uma infinidade de outros seres cruciais para a saúde dos ecossistemas. Os organismos são considerados bioindicadores essenciais da qualidade ambiental e da fertilidade do solo. Seu estudo é fundamental para práticas agrícolas sustentáveis, recuperação de áreas degradadas e para a compreensão dos processos ecológicos.
Além do trabalho de organização do professor Demetrio, o manual conta com a contribuição de uma equipe de renomados pesquisadores. Entre os autores principais estão Istéfani Wenske Haudt, Lizete Stumpf, Lívia de Oliveira Islabão, Emerson Meirelhes de Farias, Gustavo Schiedeck, Marie Luise Carolina Bartz, Miguel Cooper, Jérôme Mathieu e George Gardner Brown.
A expectativa é que o "Manual de Biologia do Solo" se torne material de consulta obrigatória para estudantes de graduação e pós-graduação, professores, pesquisadores e técnicos que atuam nas áreas de agronomia, biologia, ecologia e ciências ambientais. O lançamento marca um avanço na sistematização do conhecimento sobre este componente vital, porém muitas vezes negligenciado, da biodiversidade.
A obra conta com o apoio da Embrapa, da ESALQ/USP, da Sorbonne Université, do MAKIT (Université de Montepellier), da UFPR, da UFPel - Departamento de Solos, do MACSA, do CEFE, do FRB, do CESAB, do iDiv, da FAPESP, do CNPq, da Fundação Araucária da SBCS e do NEPAR.
A FEBRAPDP e a SPD - Soil Diagnostic foram responsáveis pelo captação e repasse de recursos e o patrocínio para viabilização dessa obra foi concedido pelas Sementes Tormenta e pela Agrícola Zanella.
A redação da Federação Brasileira do Sistema Plantio Direto – FEBRAPDP fez uma entrevista com três dos autores. Além do próprio professor Wilian Carlo Demetrio, Marie Bartz, professora e pesquisadora do Programa de Pós-Graduação em Ecossistemas Agrícolas e Naturais da UFSC, e George Gardner Brown, pesquisador da Embrapa Florestas e professor da pós-graduação em Ciências do Solo da UFPR, responderam as perguntas.
Redação FEBRAPDP: O que motivou a organização deste "Manual de Biologia do Solo" e qual é a principal lacuna no mercado ou no meio acadêmico que o senhor acredita que este livro vem preencher?
Resposta: O principal motivador foi o capítulo 2 “Macrofauna nos solos brasileiros: Estado da arte e recomendações de coleta” do livro Macrofauna edáfica nos solos brasileiros que lançaremos no próximo ano. Neste capítulo realizamos uma síntese de todos os trabalhos sobre macrofauna do solo publicados no Brasil (>200 trabalhos), incluindo além de artigos científicos também resumos em congressos e teses e dissertações, e observamos grande disparidade na forma com que a amostragem foi realizada nestes trabalhos e na ausência de diversas informações que são fundamentais para a interpretação das comunidades e para comparação de resultados entre trabalhos. Diante disso tomamos a iniciativa de gerar um manual com dicas e instruções objetivando padronizar a metodologia de coleta e as informações fornecidas nos trabalhos, padrões utilizados internacionalmente, facilitando assim futuras sínteses e modelagens destes dados.
Redação FEBRAPDP: Para além do ambiente universitário, o livro tem tração junto aos produtores que lidam com o solo no dia a dia de sua atividade econômica? Como o senhor visualiza os beneficiados oferecidos a esse público pelo manual? O senhor poderia dar um exemplo de como as informações do livro podem ser aplicadas de forma prática no campo, por um agricultor ou um técnico em manejo do solo?
Resposta: Com certeza, uma das ideias centrais do manual era tornar a amostragem da fauna do solo acessível também aos produtores rurais. Os métodos propostos, particularmente para a macrofauna são bastante simples e não precisam de equipamentos especializados, facilitando sua aplicação mesmo pelo público não especializado.
Entretanto, ainda não possuímos dados suficientes para gerarmos índices de qualidade do solo com base na macro e mesofauna do solo para todos os sistemas de uso e tipos de solo no país. No momento, possuímos um índice de saúde do solo para plantio direto/sistema plantio direto considerando a abundância e a riqueza de espécies de minhocas em latossolos vermelhos, especialmente no Estado do Paraná, que pode ser baixado gratuitamente em https://plantiodireto.org.br/uploads/saude-do-spd/Bartz-et-al-2024_protocolo-para-amostragem-quantitativa-de-minhocas.pdf. Outra proposta, baseada numa amostragem mais modesta e incluindo o uso de diversos indicadores de saúdo do solo se encontra disponível gratuitamente em https://doi.org/10.11606/9786587391557, mas esse índice ainda precisa ser verificado mais amplamente em diversos usos da terra e solos, visando sua validação.
Redação FEBRAPDP: A biologia do solo lida com organismos muitas vezes minúsculos e de difícil amostragem. A Dra. Ieda Mendes, pesquisadora da área de Solos, da Embrapa Cerrados, costuma afirmar que nosso conhecimento sobre a vida e as relações dos microrganismos de solo não chega a 10%. Como vocês percebem essa realidade hoje e como as pesquisas têm avançado?
Resposta: A fauna do solo, animais que incluem a micro, meso e macrofauna edáficos, também enfrenta os mesmos desafios. Grande parte da diversidade de espécies da macro e mesofauna (para os quais o manual é destinado) ainda é desconhecida, devido ao baixo número de taxonomistas ativos atualmente, além ainda da falta de incentivo e disponibilidade de financiamento desta linha de pesquisa (fauna do solo) em universidades e institutos de pesquisa.
Redação FEBRAPDP: Qual foi o maior desafio, seja metodológico ou de síntese do conhecimento, que a equipe enfrentou durante a produção do manual?
Resposta: Existem muitas formas utilizadas ao redor do mundo para coletar a macro e mesofauna do solo. Porém algumas são mais usadas que outras, e algumas exigem equipamentos mais especializados e não facilmente disponíveis. O nosso maior desafio foi apresentar a macrofauna e mesofauna, constituída de um número muito grande (>50) de táxons diferentes, de uma forma simples e de mais fácil entendimento, para que qualquer pessoa interessada possa estudar e identificar os grupos envolvidos. Além disso, apresentar os métodos mais simples e corriqueiros, usados e padronizados mundialmente, para que os interessados possam realizar amostragem sabendo que a forma e os resultados serão comparáveis com outros estudos ao redor do mundo.
Além disso, tanto esse manual como o outro livro sobre macrofauna, que comentamos que será lançado no próximo ano, são resultado de esforços que se iniciaram em dois projetos grandes. Um a nível mundial o sOilFauna - liderado pelo iDiv na Alemanha e outro a nível de América Latina o FaunaServices liderado pela ESALQ/USP, dos quais alguns autores deste manual fazem parte. Esses projetos sintetizam pela primeira vez as ligações entre a atividade humana, as comunidades de macrofauna do solo e como estas dependem de gradientes em larga escala, como o clima. Esses projetos têm sido um desafio gigantesco, pelo trabalho demandado, quantidade de informações levantadas e pessoas envolvidas. Mas é graças a este esforço que obras complementares, como este manual, se tornaram realidade.
Redação FEBRAPDP: Olhando para o futuro, como o senhor espera que este manual influencie a pesquisa e o manejo do solo no Brasil? O senhor acredita que ele pode ser um catalisador para que a saúde do solo em modelos de agricultura mais sustentáveis?
Resposta: A expectativa é que sim, esperamos que o manual ajude os trabalhos futuros a proverem informações valiosas sobre a macro e mesofauna usando métodos padronizados. Esperamos também que em breve, estes poderão ser utilizados para gerar índices de qualidade do solo baseados nas populações destes organismos, responsáveis por prover uma parcela considerável de serviços ecossistêmicos. E que esses resultados possam ter um efeito benéfico sobre o uso e manejo do solo no Brasil, promovendo sua conservação e sustentabilidade.









