SPD X semeadura direta: uma “confusão” que não se sustenta
Da Redação FEBRAPDP

No último 23 de outubro, foi comemorado, pela segunda vez, o Dia Nacional do Plantio Direto. Uma data que, para além da celebração das conquistas alcançadas em mais de cinco décadas uso nas lavouras brasileiras, vem de encontro à necessidade de reiterar a importância do sistema e de difundir a técnica em sua amplitude correta. Nesse sentido, diversas ações foram realizadas nas principais regiões produtoras do país a fim de tornar cada vez mais evidente as diferenças entre o Sistema Plantio Direto (SPD) e a versão que se popularizou no Brasil de semeadura direta, muitas vezes também chamada de Plantio Direto a ponto de confundir-se com o SPD. O pesquisador Marcos Aurélio Carolino de Sá, da Embrapa Cerrados, é bem objetivo e didático ao falar do assunto:
“Num contexto de culturas anuais para produção de grãos, entende-se por Plantio Direto (PD) o simples ato de fazer o plantio da cultura sob a palhada da cultura anterior, sem a necessidade de preparo de solo (aração ou gradagem), sendo o revolvimento do solo feito apenas no sulco de plantio, onde são depositados fertilizantes e sementes. Por exemplo, um agricultor pode plantar a mesma cultura todos os anos na mesma área, sem fazer rotação de culturas por muitos anos (monocultura), com a mesma dose de fertilizante, sob Plantio Direto. Isso não será sustentável a longo prazo e mais cedo ou mais tarde isso entrará em colapso, seja por pragas, doenças, desequilíbrio nutricional ou mesmo perdas de matéria orgânica e atividade biológica do solo.
Já o conceito Sistema Plantio Direto é mais amplo, e como o próprio nome diz, envolve um SISTEMA, ou seja, um conjunto de elementos que associa o plantio direto a boas práticas agronômicas, como: rotação de culturas, manejo racional de corretivos e fertilizantes conforme análise de solo, manejo integrado de pragas, doenças e plantas daninhas e práticas de manejo e conservação de solo e água. São questões que a ciência agronômica já vem demonstrando há muitos anos e nos permitem afirmar que, quanto maior a adoção de boas práticas agronômicas como um preceito, melhor, mais eficiente e mais sustentável será o Sistema Plantio Direto”.
Em termos de resposta efetiva nos resultados produtivos e, sobretudo, em termos de sustentabilidade produtiva, a comparação entre os dois modelos é uma questão vem sendo observada pela pesquisa já há alguns anos, e, conforme explica Sá, bem relatada na literatura científica nacional e internacional e o mais importante, observada na prática por um número cada vez maior de agricultores no Brasil. “Quando o agricultor passa a adotar os preceitos do Sistema Plantio Direto, ele está investindo na sustentabilidade da sua atividade a médio e longo prazo. Por exemplo, nas propriedades onde se adota o Sistema Plantio Direto, ou seja, além do plantio sem revolvimento adota-se também rotação de culturas, verifica-se maior aporte de palha e melhoria da qualidade e da saúde do solo. O manejo adequado de corretivos e fertilizantes, associado ao manejo integrado de pragas, possibilita redução de custos, maior eficiência no uso de insumos e melhora a rentabilidade do produtor. Normalmente se observam maiores produtividades com maior eficiência econômica”, explica o pesquisador.
Ele continua: “solos bem manejados são mais produtivos a curto, médio e longo prazo, e isso é um fato. Quando se fala em Sistema Plantio Direto, com rotação de culturas, um bom aporte de palha para cobrir o solo e fornecer matéria orgânica, práticas conservacionistas para proteger o solo da erosão, manejo adequado de fertilizantes e pesticidas, estamos vislumbrando muito mais do que a questão ambiental. Estamos falando também em eficiência econômica, lucros a médio e longo prazo. Por exemplo, hoje, com a tecnologia da Bioanálise de Solo (BioAS), o agricultor pode monitorar a saúde do seu solo, e já é comprovado: áreas bem manejadas são mais produtivas, têm um solo mais saudável e tendem a ter maior resiliência com relação às adversidades climáticas, como veranicos, por exemplo”.
Um olho na propriedade e outro no mercado
Para Marco Aurélio Sá, a agricultura requer muito mais do que paixão, dedicação e investimento financeiro. Agricultura requer conhecimento. Para se fazer um bom Sistema Plantio Direto, o agricultor necessita conhecer bem cada canto da sua propriedade e cada etapa do seu processo produtivo. Segundo ele, é preciso ler, se informar, se atualizar, buscar conhecimento técnico, assistência técnica adequada. “Ter o pé no chão, um olho na propriedade e outro no mercado. Mais importante do que o ‘maquinário da moda’ é ter um parque de máquinas dimensionado de acordo com as características da propriedade e que realmente atenda suas necessidades. Mais importante do que os ‘insumos da moda’ é estar atento ao que tem comprovação científica e realmente funciona”.
Notadamente, há inúmeros contextos dentro da realidade de cada produtor rural que acabam como argumentos para justificar a inviabilidade do emprego do SPD em sua integralidade. Seja pela impossibilidade de produzir boas palhadas, seja pelo desafio organizacional, ou ainda, e, principalmente, pelas circunstanciais vantagens econômicas com a realização da mera sucessão de soja e milho em detrimento da rotação de culturas. Muitas vezes, são produtores que têm acesso à informação técnica de qualidade e, portanto, elementos para tomar uma decisão olhando para o sistema como um todo.
“Vivemos em um mundo competitivo, onde para sobreviver o agricultor precisa ser eficiente, inovar e se adaptar. Em algumas regiões do Cerrado, como por exemplo no Oeste da Bahia, é difícil fazer duas safras por ano em condições de sequeiro. A solução encontrada para formar palha foi inserir a braquiária no sistema, em consórcio com o milho. No ano seguinte, entra soja ou algodão. Quanto mais diversificado for o sistema de rotação de culturas, mais sustentável tende a ser o Sistema Plantio Direto, mesmo que as condições climáticas não permitam a realização de duas safras por ano. É preciso ter em mente que, para se obter sucesso em qualquer atividade econômica, e na agricultura não é diferente, é preciso pensar no curto, médio e longo prazo. Agricultura tende a ser um negócio que passa de pai para filho, de geração para geração. Se o agricultor não cuidar bem do seu solo hoje, como ele vai deixar uma propriedade produtiva para seus filhos? Quando falamos em Sistema Plantio Direto e boas práticas agronômicas, estamos pensando em sustentabilidade. Ou seja, um negócio sustentável precisa atender a critérios ambientais, econômicos e sociais. Quando falo em sustentabilidade social, estou dizendo que a mesma terra que produz alimentos para a geração atual terá que produzir em maior quantidade ainda para atender as gerações futuras, pois a população aumenta a cada ano. É uma questão de sucesso ou fracasso não apenas para o agricultor, mas para as nações e para a humanidade. Para transformar este contexto, creio que o primeiro passo é buscar informação e conhecimento e sempre se atualizar. O agricultor deve observar os casos de sucesso de agricultores que adotam um bom Sistema Plantio Direto. Aprendemos uns com os outros. E cada um, dentro de suas próprias condições e da sua realidade, ver o que é possível melhorar mesmo que seja aos poucos”, afirma Sá.